V Centenário do Nascimento de Luís de Camões
1524 — 2024
O Relógio Divino
Ensina o Livro sagrado que” nada há escondido que não venha a ser revelado nem oculto que não venha a ser conhecido” (Lucas 12:2). O relógio divino indica o tempo adequado à manifestação de algo bem como à sua assimilação, porém, nem sempre estes dois momentos coincidem. Podemos observar estas circunstâncias a nível individual e coletivo. A vida e obra de Camões exemplifica muito bem esta situação. A data do seu nascimento não tem sido consensual, tema que já foi abordado por vários autores, destacando-se o estudioso rosacruciano Francisco Marques Rodrigues, cujos artigos em boa hora publicou num trabalho inovador que juntou algumas disciplinas (Literatura, Astronomia e Astrologia), tendo situado o nascimento do poeta no dia vinte e três de janeiro de mil quinhentos e vinte quatro. É sempre com agrado que a Fraternidade vê os estudos que anteriormente realizou serem confirmados e divulgados por outras entidades a um público mais amplo.
A Universidade de Coimbra proferiu uma conferência precisamente no passado dia 23 de janeiro, baseado nas tabelas astronómicas e nos sonetos do poeta de cunho biográfico. O selo científico veio confirmar o que já se sabia e alargar este facto ao público, demonstrando, assim, quão a vida do poeta está ainda por descobrir.
Poder-se-ia perguntar, então, por que razão tanto a vida do poeta como os aspetos da sua obra têm ficado na sombra. A resposta tem várias raízes. A mais importante prende-se com a inovação da sua obra, o pioneirismo dos seus ensinamentos que estavam muito para além dos ensinamentos da Religião, da Inquisição e do pensamento da época, ainda que o Renascimento tenha dado um impulso ao pensamento científico e cultural da Europa. Ainda hoje, a sua obra não é completamente assimilada pelo nosso tempo porque o materialismo vigente e o pensamento a ele associado não deixam subir à superfície a espiritualidade encerrada n`Os Lusíadas, mais precisamente a filosofia rosacruz que o poeta adotou, depois de a ter estudado em Coimbra e em Sevilha; por isso, o olhar sobre a sua nobre epopeia ainda é extraordinariamente redutor. Será com o cruzamento de várias disciplinas (Literatura, Astronomia, Astrologia e Cristianismo de cunho rosacruz) que poderemos avançar no estudo da sua obra.
Além disso, sendo a sua obra de raiz rosacruciana, ela irá sendo desvendada à medida que o Cristianismo também for evoluindo, pois Max Heindel alerta-nos que ainda estamos a viver uma fase primária dos ensinamentos de Cristo. Deste modo, entre o tempo da manifestação e o tempo da assimilação podem distar séculos, no entanto, quando chegar a hora para que tais ensinamentos possam ser compreendidos por alguns, mais leituras terão a oportunidade de surgir a superfície dos dias, tal como o estudo da Universidade de Coimbra exemplifica, e oportunamente partilhadas com o público. Assim sendo, a obra do poeta está entrelaçada nos ensinamentos rosacruzes, caminham juntos pelo tempo.
Entretanto, para os pioneiros da Era de Aquário, altura em que o Cristianismo estará numa fase muito mais desenvolvida, o tempo não é para descansar. Não devemos deixar as obras adormecidas, mas estudá-las, cruzando vários saberes, tentando encontrar outros sentidos e partilhá-las com quem já se predispôs a trilhar um caminho no âmbito da espiritualidade, seguindo o exemplo de Francisco Marques Rodrigues.
Assim, através do estudo, da partilha e da reflexão, o pensamento evolui, os ensinamentos atualizam-se e passam às gerações vindouras, pelo que é da responsabilidade de cada estudante não se deixar adormecer sobre a crosta ilusória do materialismo e de algumas ideias contrárias aos ensinamentos de Cristo. São os contextos difíceis que vivemos que colocam à prova o nosso discernimento e a nossa resiliência; é vivendo a experiência diária que provamos a nossa fidelidade aos ensinamentos do Mestre e temos oportunidade de evoluir, tal como a vida de Camões é disso um exemplo.
Maria Coriel
SAA, Mário. Memórias Astrológicas de Camões, Edições do Templo, Lisboa, 1978.
SILVA, Luciano Pereira. A Astronomia de “Os Lusíadas”, Junta de Investigações do Ultramar, Lisboa,1972.